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Entrevistas

Defensor entusiasta do Cerrado. O senador Rodrigo Rollemberg falou ao Ecodata Informa sobre os desafios ambientais que se colocam para a conservação do Cerrado, a participação do bioma na Rio +20 e as expectativas em relação aos impactos da Conferência.

Confira a entrevista.

Ecodata Informa: Com o objetivo de buscar informações que subsidiam a elaboração de projeto de lei de proteção ambiental para o bioma Cerrado, ocorreu, em maio, audiência pública com o tema: Preservação do Cerrado e Rio+20, promovida pela Comissão de Meio Ambiente, onde o senhor é o presidente. Quais foram os resultados desta discussão? Quais as próximas etapas?

Senador Rodrigo Rollemberg: Nessa reunião defendemos, junto com especialistas convidados, a criação de uma legislação específica para o Cerrado. Estamos levantando mais subsídios para um possível projeto de proteção a esse bioma, que é o segundo maior do País, depois da Amazônia. Contudo, o ideal é que a Câmara aprove, o quanto antes, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC  115) do Cerrado, que tramita desde 1995. A matéria está pronta para apreciação do plenário. Além da PEC 115 há outras propostas de conteúdo semelhante, como a PEC  51/2003, já aprovada no Senado e remetida à Câmara. Falta um acordo de plenário para que os deputados apreciem essas propostas. Em conversas com presidente da Câmara, já solicitei agilidade na votação das proposições que valorizam e protegem nosso Cerrado.

Ecodata Informa: Considerando os desafios ambientais que se colocam para a conservação do Cerrado, existe uma expectativa  sobre os principais impactos da Rio+20  e como estes contribuirão para a preservação do bioma. Para o senhor, qual legado a Rio+20 vai deixar para a conservação do Cerrado?

Senador Rodrigo Rollemberg: Há muita expectativa em torno da Rio+20. Sabemos que a conferência não produzirá documentos como a Rio-92, que resultou em 3 convenções e na Agenda 21. Mesmo assim,  defendo  e confio que a Rio+20 deixe um legado interno. A prioridade deve ser a definição de metas de implementação dos compromissos assumidos no Rio de Janeiro há 20 anos, os chamados objetivos do desenvolvimento sustentável. Esses objetivos precisam ser práticos, como por exemplo a redução de 70% para 60% da água utilizada na agricultura. A atividade agrícola é a maior consumidora de água, utiliza cerca de 70% da água do planeta. Segundo renomados cientistas, com mais tecnologia e uso eficiente, teremos condições de reduzir 10% da utilização da água na agricultura. Essas e outras medidas terão impacto positivo não só no Cerrado, mas nos demais biomas brasileiros.

Ecodata Informa: O presidente da Ecodata, Donizete Tokarski, chama a atenção para a necessidade da criação de um programa especial de proteção para áreas de nascentes do Cerrado, “Arco das Nascentes”.   Para o senhor, qual a importância de se transformar o Arco das Nascentes em uma área prioritária de conservação?

Senador Rodrigo Rollemberg: Essa  proposta é fundamental para a conservação dos recursos hídricos, pois se as cabeceiras  não forem protegidas não há como preservar  o bioma da região do Arco das Nascentes,  que reúne vários rios, responsáveis  pelo fornecimento de grande parte da água que abastece as principais bacias brasileiras. O Cerrado é a verdadeira caixa d ‘água  do Brasil e necessita de programas como esse, para salvaguardar seus recursos hídricos e sua biodiversidade,  antes que seja tarde demais, pois muitas espécies da fauna e da flora já desapareceram.

Ecodata Informa: Para o senhor, por que é tão difícil vencer o desafio  de  combinar produção e proteção do Cerrado, bioma que reúne 5% da biodiversidade do planeta?

Senador Rodrigo Rollemberg: Na prática não é difícil, se utilizarmos  todo conhecimento disponível e novas tecnologias de plantio. Dados da Embrapa indicam  que de 1975 a 2010 a área colhida com relação a grãos cresceu em 45,6%, enquanto a produção aumentou em 268%. Com novas tecnologias, podemos aumentar a produção sem devastar novas áreas. Outra questão que pode melhorar é a baixa  ocupação por cabeça na produção agropecuária, que é de uma cabeça por hectare. Aumentando essa ocupação de forma sistemática teremos áreas liberadas. No país, 200 milhões de hectares são utilizados pela pecuária. Se conseguíssemos dobrar a produtividade em 10 ou 20 anos, mantendo o mesmo rebanho, estaríamos liberando 100 milhões de hectares, que poderiam ser utilizados para a produção de alimentos, de agroenergia, para aumentar a capacidade produtiva brasileira sem precisar avançar em novos biomas.

Ecodata Informa: Até o ano de 2008, mais de 47,9% da cobertura original do Cerrado já havia sido desmatada. Para o senhor, por que o Bioma Cerrado nunca foi prioridade nas pautas públicas, quando o assunto é preservação?

Senador Rodrigo Rollemberg: De fato, apesar de alguns esforços de parlamentares e governo para chamar a atenção  para o Cerrado, quem tem ocupado o centro das discussões mundiais é o bioma Amazônia, cujo significado é emblemático para o mundo, devido à exuberância de suas florestas. Entretanto, no Cerrado o desmatamento é mais grave que na Amazônia, onde a área de floresta remanescente é de cerca de 82%, enquanto no Cerrado essa área é de 52% . Até o ano de 2008, aproximadamente  97,6 milhões de hectares  do Cerrado já haviam sido desmatados. Este é um dado alarmante, mas creio que essa realidade  aos poucos será revertida com o apoio de políticas públicas, ações legislativas e o trabalho de diversas organizações que lutam pelo Cerrado, a exemplo da própria Ecodata.

Ecodata Informa: Como a senhor avalia o Código Florestal  após os vetos da presidente Dilma Roussef? O Cerrado será beneficiado ou não com o novo código?

Senador Rodrigo Rollemberg: Depois dos vetos, praticamente será construído um outro  Código Florestal a partir da Medida Provisória 571/12. A proposta já recebeu mais de 600 emendas no Senado. Eu  apresentei emenda visando a proteção das nascentes e olhos d´água, que são estratégicos para o futuro do País e a sustentabilidade da agricultura. A emenda disciplina o tratamento da recuperação das nascentes. Pela minha sugestão, nos casos de áreas rurais consolidadas em Áreas de Preservação Permanente (APP), no entorno de nascentes e olhos d’água, será admitida a manutenção de atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo ou de turismo rural, sendo obrigatória a recomposição do raio mínimo de 30 metros. Espero que, no final, o Código Florestal resgate o texto aprovado pelo Senado, que apesar de não ser perfeito  confere mais proteção às APPs e define inovações, como instrumentos econômicos para preservar os recursos naturais.

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Coordenador Geral de Manejo para Conservação do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), o biólogo Ugo Vercillo falou ao Ecodata Informa sobre as espécies da fauna do Cerrado que estão ameaçadas, como é definido o risco de extinção e o que o Instituto tem feito para proteger os animais que vivem no bioma.

Confira a entrevista.

Ecodata Informa: Como se define a ameaça e a extinção de uma espécie?

Ugo Vercillo: Considera-se que uma espécie está extinta quando é feita uma busca intensiva durante dez anos e não conseguimos encontrá-la. Identificamos uma espécie ameaçada de extinção quando, na natureza ou no cativeiro, existem condições e alterações em sua ocupação.

EI: Qual a metodologia utilizada para essas definições?

UV: Seguimos uma metodologia mundial estabelecida pela União Internacional de Conservação da Natureza (UICN). É um organismo que reúne vários atores ambientais da sociedade mundial. Participam governos, ONGs, pessoas físicas e jurídicas.  A UICN é o único observador com direito a voz nos fóruns ligados ao meio ambiente da ONU (Organização das Nações Unidas). O Brasil já fez parte da UICN mas, em virtude de custos, parou. Agora o País está rediscutindo se volta ou não a participar.

EI: Como é avaliado o grau de ameaça das espécies?

UV: Dividimos em categorias.

As espécies extintas
Extinta – Uma espécie buscada por 10 anos e não encontrada.
Extinta na natureza – Espécie que existe apenas em cativeiro. No Brasil um exemplo é a Ararinha Azul.
Regionalmente extinta – Espécie que não existe mais em determinada região.

As espécies ameaçadas
Criticamente – Alto risco de extinção na natureza
Em perigo – Não está em condições críticas de extinção, mas corre um alto risco
Vulnerável – Risco de extinção em médio prazo

EI: E como está este diagnóstico entre as espécies do bioma Cerrado?

UV: Hoje a fauna mais ameaçada do Cerrado divide-se em 15 espécies, sendo 1 anfíbio, 4 aves, 4 invertebrados terrestres, 5 mamíferos e 1 peixe. O número total chega a 132 tipos de animais.

EI: Ao que podemos atribuir a ameaça de extinção das espécies nesse bioma?

UV: A situação das espécies do Cerrado que estão ameaçadas é um reflexo do crescimento agroindustrial na região, da plantação de soja, do gado. Com a expansão do agronegócio, houve uma grande redução das áreas nativas e, por isso, várias espécies tiveram uma queda significativa de suas populações e passaram a fazer parte da lista de espécies ameaçadas. O morceguinho do Cerrado é um exemplo.

EI: Como o morceguinho do Cerrado está sendo ameaçado?

Fonte: Google Images

UV: A mineração e a destruição das cavernas são as principais atividades que têm impactado diretamente nas populações da espécie. Já iniciamos algumas estratégias para conservação, ligadas ao conhecimento científico e ao trabalho de informar e conscientizar a população das regiões próximas.

EI: E qual o maior problema que o Cerrado enfrenta em relação a conservação da fauna?

UV: Evidentemente é a perda da mata nativa do cerrado. 90% das espécies ameaçadas de extinção são devidos às plantações, rodovias e pastos, que têm trazido alteração desse ambiente natural e, consenquetemente, o desaparecimento das espécies.

EI: Os empreendimentos implantados em áreas de Cerrado afetam as Unidades de Conservação? Como é o diálogo entre empreendedores e autoridades ambientais?

UV: Todo empreendimento que afeta um lugar de conservação requer uma autorização do órgão que fiscaliza o meio ambiente. Hoje no Cerrado, 30 UCs são afetadas por empreendimentos, ou seja, ficam dentro ou próximo a uma Área de Proteção Ambiental (APA). Nestas UCs, já foram detectadas 76 espécies ameaçadas e 44 já têm planos de ação.

Quando a situação chega até nós, propomos medidas para manter os atributos daquela região como está.  Eu acredito que é possível sim ter empreendimentos e ao mesmo tempo conservar o bioma. Um exemplo é o Parque Nacional de Brasília, a Água Mineral, onde existem áreas de proteção e ao mesmo tempo área de lazer para a população.

EI: O que tem sido feito para minimizar os riscos sofridos pela fauna do Cerrado?

UV: O ICMBio possui várias estratégias, a principal é estabelecer áreas protegidas e corredores para conectividade dessas áreas. São 48 Unidades de Conservação no Cerrado que abrigam 41 espécies ameaçadas. Temos evoluído nas pesquisas e nos planos de ação e, junto ao Ministério do Meio Ambiente, estamos definindo um novo horizonte para o Cerrado. Queremos aliar os planos à busca de interlocução com o setor de desenvolvimento, recomendar práticas paliativas para os empreendimentos. O objetivo não é reduzir o crescimento ou inibi-lo, queremos otimizar , verificar onde melhor pode-se  desenvolver e ao mesmo tempo proteger as áreas importantes para o bioma.

Ugo Vercillo deixa um recado…

O Brasil é o país nº 1 em biodiversidade e proteger todo esse patrimônio e riqueza é complicado.  Temos que trabalhar o desenvolvimento socioeconômico atrelado à preservação e proteção das espécies.

Precisamos propor cenários onde possamos atuar de forma mais clara e pontual, mais robusta, com ações locais e não ações genéricas. Este trabalho só funciona se puder contar com o engajamento de todos os setores. Não basta só o governo e o ICMBio, é necessário que outros entes federativos e a sociedade civil estejam envolvidos, que encarem também esse desafio!

Pesquisador em Hidrologia e Recursos Hídricos na Empresa Brasileira de Agricultura e Pecuária (Embrapa), Jorge Werneck falou ao Ecodata Informa sobre a importância do Cerrado para os recursos hídricos brasileiros, os impactos causados pelo desmatamento do bioma e o papel do Governo e da sociedade nesse contexto.

Confira a entrevista.

Ecodata Informa: O que são Regiões Hidrográficas?

Jorge Werneck: Até o ano de 2003, o Brasil era subdividido em oito grandes bacias hidrográficas. A partir desse ano, o Conselho Nacional de Recursos Hídricos aprovou uma divisão do território brasileiro em 12 grandes regiões hidrográficas.  Porque o nome de regiões hidrográficas: porque em algumas delas você encontra mais de uma bacia dentro. Por exemplo, o litoral possui várias bacias não tão grandes e que deságuam no oceano, por isso que recebe o nome de região hidrográfica. Algumas regiões são bacias hidrográficas, como é o caso do São Francisco, Paraná e Paraguai.

Ecodata Informa: O que acontece com a água do bioma Cerrado?

Jorge Werneck: O Planalto Central brasileiro está localizado no bioma Cerrado. A região, como o próprio nome diz, é central e alta. Então ela acaba funcionando como se fosse um grande “guarda-chuva”, um grande reservatório que acaba participando da distribuição da água por todo o continente sul-americano, não só Brasil. Quando você pensa na bacia do Paraná e do Paraguai, por exemplo, e que nascem no Cerrado, está pensando em outros países que estão águas abaixo.
Das 12 regiões hidrográficas, oito são abastecidas por águas que vêm do Cerrado. Isso representa um grande percentual do território. As bacias do Paraná, Paraguai, Tocantins-Araguaia, do São Francisco, um pouco da bacia Amazônica e algumas bacias do Atlântico recebem águas do Cerrado.

Ecodata Informa: Qual a contribuição do Cerrado para as demais bacias hidrográficas do Brasil?

Jorge Werneck: Assim que eu cheguei para trabalhar na Embrapa Cerrados, em 2001, ouvia muito que “o Cerrado é o pai das águas do Brasil… É o berço das águas do Brasil… O grande reservatório das águas do Brasil.” Então uma das coisas que quis fazer foi quantificar, saber quanto o Cerrado é importante para cada uma dessas bacias e regiões hidrográficas.
Neste trabalho, peguei os limites do Cerrado e comparei a vazão que atravessa esses limites com a vazão que sai na foz das bacias. A partir disso cheguei a alguns valores interessantes: O Cerrado ocupa 47% da área da bacia do São Francisco e reponde por mais de 90% da água que passa na foz da bacia. Para a região hidrográfica do Tocantins-Araguaia, o Cerrado contribui com pouco mais de 60% da água que é gerada. Para a bacia do Tocantins-Araguaia, este valor chega a mais de 70%.
Na bacia do Paraná, cerca de 50% da foz brasileira também vem do Cerrado. A metade da vazão que passa em Itaipú é gerada no bioma Cerrado.  Ou seja, 50% da energia gerada em Itaipú. e se você considerar toda a cascata vai dar mais do que isso, um percentual razoável da energia gerada no Brasil, vem das águas do Cerrado. Em alguns lugares os dados foram ainda mais interessantes. Na bacia do Parnaíba, por exemplo, também abastecida pelo Cerrado, mais de 100% da vazão que sai na foz veio do bioma.
Outro número alto é referente à vazão da bacia do Paraguai, quase 140%. O número ocorre porque abaixo desta bacia está o Pantanal, uma grande área alagada. É como se fosse um grande tanque de evaporação, então, passa mais água do Cerrado para o Pantanal do que do Pantanal para o rio Paraguai. O balanço hídrico do Pantanal, de uma forma global, é negativo. É como se ele consumisse grande parte da água que vem do Cerrado.

Ecodata Informa: Qual a importância da manutenção adequada do bioma Cerrado?

Jorge Werneck: Se o bioma continuar a ser impactado, a alteração provocará um efeito dominó. O ambiente é adaptado aos animais, às pessoas. A vida gira em torno disso e aí você consegue ver claramente qual a importância dos recursos hídricos que são gerados no Cerrado. Além da importância que tem para as pessoas que moram no bioma, abastecimento, irrigação, produção de alimento e geração de energia elétrica no País. A manutenção da região hidrográfica impacta praticamente todo o Brasil. Isso levanta a questão da necessidade de bom trato deste recurso.

Ecodata Informa: Que tipo de alterações o desmatamento provoca no ciclo hidrológico?

Jorge Werneck: Quando o desmatamento é feito para uma ocupação não muito adequada, que deixa o solo exposto, que não cobre rapidamente o solo, plantio de culturas de crescimento rápido, você acaba causando o secamento do solo. Estes impactos geralmente são notados em escala muito menor, em pequenas bacias. Mas em longo prazo, fazendo isso em muitos locais, é possível causar interferência. Em cidades e locais com grandes concentrações de pessoas, você normalmente vai encontrar problemas com a qualidade da água.
Quando se fala em agricultura, uma atividade que usa grandes áreas e, obviamente tem alguma coisa de poluição difusa, diferente da poluição concentrada (gerada pelos centros urbanos), temos um problema de conflito. Quando você utiliza os recursos hídricos sem considerar a capacidade de suporte das bacias hidrográficas, onde você implementa, por exemplo, sistemas de irrigação em áreas concentradas sem considerar a vazão disponível no rio, de forma adequada, por falta de informação ou problemas de gestão, ou por tudo isso somado, tem-se um conflito estabelecido.

Ecodata Informa: O que poderia falar sobre…

A gestão dos recursos hídricos no Brasil

Jorge Werneck: A gestão dos recursos hídricos brasileiros vem evoluindo de forma até rápida para que possamos minimizar problemas, para que façamos um ordenamento do uso do solo, compatível com a disponibilidade hídrica e os riscos ambientais envolvidos.

Saneamento

Jorge Werneck: A questão do saneamento é primordial. Muitas vezes as prefeituras e os governos não fazem os investimentos que deveriam. Há um passivo nisso, quer dizer, é preciso muito dinheiro para resolver problema de saneamento no país. Acho que a situação tem melhorado: saneamento, sistemas de drenagem, e as cidades menores já começam a verificar que isso é uma coisa séria, inclusive é uma questão de saúde, porque o ser humano, como elemento poluidor, contribui para a geração de lixo e de sujeira.
Saneamento é uma questão geral. O Distrito Federal, por exemplo, cresce quase 100 mil habitantes por ano. Nunca vi crescer tanto assim. Isso tudo, obviamente, reflete nos recursos hídricos, pois significa um lançamento de esgoto in natura. Para atender a necessidade crescente, os sistemas de tratamento tem que estar o tempo todo evoluindo e aumentando suas fontes de captação.

Agricultura

Jorge Werneck: Em termos de agricultura, o que chama atenção, hoje no Cerrado são os 60 milhões de hectares sob pastagem, e boa parte dessa pastagem tem algum grau de degradação. Isso acaba se refletindo como um problema: atrapalha infiltração, aumenta escoamento e erosões. Se você tem uma boa pastagem, não tem coisa melhor para uma cobertura de solo, porque ela realmente evita o impacto da gota, o escoamento e o carreamento de sedimentos. Mas quando você tem a pastagem em um certo grau de degradação, todos esses benefícios que poderiam ser gerados, acabam piorando a situação do que se tinha originalmente no Cerrado.

A entrada da cana no Cerrado

Jorge Werneck: Este é um assunto que tem chamado atenção. Estamos buscando gerar dados e informações para isso. Em muitos locais o regime de chuva não é suficiente para manter a produção, ou seja, você precisa de irrigação. Temos feito estudos para tentar quantificar o quanto se pode utilizar da água para isso. Estima-se que o Cerrado tenha o potencial de 10 milhões de hectares para serem irrigados e hoje, são irrigados aproximadamente 1 milhão de hectares. Ainda há um grande potencial, porém é isso deve ser feito de uma forma muito bem pensada.

Construção de hidrelétricas

Jorge Werneck: A construção de grandes barragens altera consideravelmente o regime dos rios.  Dependendo de onde sejam construídas essas barragens e de como seja feita a operação e a gestão, você pode causar impactos maiores do que os benefícios que elas podem gerar. Isso de uma forma geral é o que eu acho sobre o desenvolvimento da agricultura e do setor elétrico.

Sobre o conhecimento

Jorge Werneck: Conhecimento sempre vai faltar. É impossível conhecermos completamente o que acontece na natureza, em todos os rios, em todos os locais. Precisamos continuar evoluindo nos estudos hidrológicos.

Boas práticas

Jorge Werneck: Uma coisa muito relevante é o zoneamento econômico e ecológico, desenvolvido para identificar o potencial de utilização e a capacidade de suporte das áreas dentro do Cerrado. Você precisa identificar se determinado local tem aptidão agrícola, por exemplo, porque se não tem, o custo para se trabalhar de forma adequada fica muito alto. Então, provavelmente, isso não vai acontecer. Precisamos identificar quais são as áreas mais apropriadas. Aí acho que está o papel do Estado: fornecer estrutura e informação para que isso ocorra de forma adequada.

O papel do Governo e da Sociedade Civil

Jorge Werneck: O papel do Estado é organizar toda a base de informações que ele mesmo precisa na definição do potencial de utilização dessas áreas. Não que ele tenha que fazer isso sozinho. As empresas que vão fazer os empreendimentos e que tem interesse nos empreendimentos já fazem estudos, alguns inclusive, muito bons. Muitas vezes esses estudos são colocados numa prateleira e quando vai ser feita uma nova ação na mesma região, é como se aquele estudo tivesse sido esquecido.
Acho que deve funcionar como uma parceria, não só na esfera pública. Penso que as ONGs entram nessa parceria para verificar e acompanhar de perto, tentando trazer um equilíbrio entre as forças econômicas e políticas com a vontade da sociedade.
Hoje, quando se fala em gestão de recursos hídricos, sabemos que os comitês de bacia são formados por representantes do Estado, usuários da água da bacia e organizações civis de recursos hídricos. É neste cenário que se aprovam os planos de bacia. Acho que a participação das ONGs de forma ativa dentro desses comitês, por exemplo, é uma forma muito interessante e legítima de participação. As ONGs têm o papel fundamental de fazer o link entre a sociedade e o Estado, mas também devem ser um difusor das decisões do Estado para a sociedade.

Oficinas ministradas por agentes ambientais da Ecodata são responsáveis por aliar teoria e prática da educação ambiental junto à comunidades locais. As atividades fazem parte do Programa Básico Ambiental (PBA) de Educação Ambiental da Corumbá Concessões S.A., contratante da Ecodata para realização do serviço.

Mariana Bulhões, agente do município de Alexânia/GO, falou ao Ecodata Informa sobre a experiência de lidar com educação e meio ambiente, a aproximação com as pessoas da comunidade e a importância do trabalho realizado.

Confira a entrevista:

Ecodata Informa: Como o município de Alexânia recebe as atividades realizadas pela Ecodata por meio dos PBA de Educação Ambiental da Corumbá Concessões S.A.? E como é o relacionamento entre os agentes ambientais e a comunidade?

Mariana Bulhões: Quando a comunidade percebe que as atividades e cursos que realizamos aliam teoria e prática na educação ambiental, noto que há um despertar da curiosidade sobre o nosso trabalho. Sobre a relação entre os agentes e as pessoas da comunidade, ela é de muita proximidade e respeito, pois construímos uma vivência positiva ao longo de dois anos de acompanhamento do programa.

EI: Quais foram as últimas atividades realizadas no município? Qual o perfil e a média de participantes das oficinas?

MB: As atividades do mês de fevereiro em Alexânia foram a Construção de Viveiro de espécies nativas do Cerrado, que aconteceu na Escola Parque Alvorada IV, e o Curso de Capacitação e Reciclagem de Agentes Ambientais e Professores, realizado no auditório da Prefeitura. Em média participam cerca de 30 pessoas. Geralmente o grupo é formado por mães, donas de casa, idosos e alunos. No caso da oficina para a construção do viveiro, participaram alunos do 9° ano e a atividade de capacitação foi voltada a diretores, coordenadores e professores da rede municipal de ensino.

EI: E quais são os principais resultados que você percebe quando conclui o trabalho de educação ambiental?

MB: Os resultados obtidos são a maior informação e conscientização sobre o Cerrado e seu uso sustentável. É notória a mudança de pontos de vista sobre a valorização do meio ambiente. Estes exemplos, atrelados à geração de renda e a noção de pertencimento à cultura do bioma, são os depoimentos mais comuns de transformação pessoal e profissional que ouvimos.

EI: Um professor da Escola Parque Alvorada IV já havia trabalhado com viveiros, na Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Embrapa. Como isso contribui para o projeto realizado?

MB: Contribui muito, pois além do compromisso que terá como professor de uma escola que recebeu o viveiro, ele tem o interesse pessoal de manter e fazer uso das mudas ali semeadas, seja para reflorestamento da região, da escola ou para a recuperação de nascentes.

EI: Para você, qual a importância da realização dessas atividades?

MB: Acredito que as atividades realizadas no Programa de Educação Ambiental (PEA) são sementes de cidadania, de consciência ecológica, de sustentabilidade. Somadas umas as outras criam pessoas mais integradas com o meio em que vivemos e com a necessidade de pensar globalmente e agir localmente.

EI: E o que pode falar sobre a sua experiência pessoal nesse contexto?

MB: Como não sou da área “verde”, sou da arte e da educação, acho que é importante fazer as pessoas pensarem que não só a fauna, a flora e as águas estão em risco e são importantes de conservar, mas também a cultura, os saberes e os fazeres do homem cerratense. Isto também está em extinção. A cultura e o meio ambiente estão intimamente ligados. Como as festas, as danças, os mutirões, o jeito de contar estórias, as músicas de raiz, o cozinhar, os hábitos, crendices, tudo isso me interessa. Eles dão ao bioma Cerrado sua essência e quem não conhece esse cenário, não valoriza.

O paranaense Cleiton Blahun mora em Goiás há um ano e já se declara apaixonado pelo Cerrado. Agente ambiental da Ecodata, contrata pela Corumbá Concessões S.A para desenvolver o PBA de Educação Ambiental no município de Abadiânia/GO, Cleiton foi um dos seis participantes da Conferência Municipal que foram selecionados para atuar como delegados na Conferência Estadual de Meio Ambiente.

O Ecodata Informa conversou com Cleinton. Confira a entrevista.

Ecodata Informa: No dia 27 de janeiro você participou da Conferência Municipal de Meio Ambiente realizada em Abadiânia. Quais foram as principais questões levantadas neste encontro?

Cleiton Blahun: Os temas abordados nesta Conferência foram basicamente cinco: agroextrativismo, políticas de resíduos sólidos, unidades de conservação e ICMS ecológico, pagamentos de serviços ambientais e comitê de bacias hidrográficas. O assunto mais debatido foi a questão dos resíduos sólidos, quando tratamos da proposta para coleta de lixo e entulho nos arredores do Lago Corumbá IV.

EI: Você foi convidado para participar da Conferência Regional de Luziânia. Como isso aconteceu?

CB: Foi durante a Conferência em Abadiânia. Me candidatei a delegado e, após a votação, fui um dos seis selecionados para participar e representar o município na Conferência Estadual de Meio Ambiente. A partir deste momento assumi uma enorme responsabilidade com Abadiânia e seus moradores: contribuir para trazer benefícios ambientais e melhorias na qualidade de vida das pessoas.

EI: Como a Ecodata participou das Conferências?

CB: Agroextrativismo é um tema que a Ecodata defende, por isso esteve diretamente envolvida com este grupo. Participaram das Conferências os agentes Simone Reis, Thais Souza e eu, o coordenador de campo, José Akashi, e o Presidente do Conselho da Ecodata, Donizete Tokarski.

EI: Como você pretende contribuir para as atividades da Conferência e como vê a importância deste encontro?

CB: A Ecodata tem me ensinado que não basta saber tudo sobre o Cerrado, que primeiro temos que ser um amante dele. E esta é uma boa oportunidade para que possamos defender e argumentar as propostas que resultaram da Conferência em Abadiânia.
Para mim, a parte mais importante é o trabalho conjunto entre ONGs, poder público, sociedade civil organizada e setor empresarial. Todos trabalhando pelo bem comum, expondo problemas e elaborando propostas para soluções e melhorias para os municípios, regiões e Estado.